12 de jun. de 2010

Dia dos namorados: data em extinção?


http://www.rebelado.com/foto/fotos-sobre-o-dia-dos-namorados/

Dia dos namorados ou dos ficantes?
por Greyce Ávila*

A data – 12 de junho – é inspiradora e reflexiva. Não vivenciei, mas as artes, em suas diversas formas, estão aí a testemunhar que houve um tempo em que enxergar o tornozelo da mulher amada era o máximo do encantamento para um homem apaixonado. Evoluímos para o namorar na sala, na igreja, de longe, sempre sob os olhares atentos de alguém muito próximo, geralmente um irmão dedo-duro que, em troca de algumas bolinhas de gude ou de figurinhas do álbum da hora, concordava em guardar nossos segredos das mãos dadas ou de um beijo roubado. E o tempo veio andando devagar, como o velho cansado que era e as conquistas de espaços e de direitos foram crescendo, dizendo ao que vieram e as coisas começaram a mudar. Já havia a despedida no portão e um êxtase incentivador a apressar o casamento.
As escolas, então, passaram a acolher meninos e meninas, sem a separação que atraía, mas que também repelia. Houve a necessidade de a mãe sair de casa para trabalhar e, logo em seguida, seus anseios em caminhar com seus próprios pés, ao lado do homem, em busca do seu sol, da sua luz. Desejo legítimo.
Infelizmente, no entanto, não soubemos fazer esta transição com o equilíbrio necessário.
De repente, o tempo enlouqueceu e, com arroubos de juventude, resolveu atropelar tudo. Viramos todos birutas barretes de saci, no alto dos telhados a mostrar ventos sem direções. E a incentivar este tempo, a rede. Uma rede de malhas tão fortes, que aproxima e afasta. Que nos faz navegar em mares virtuais, mas nos joga para o quarto, sozinhos, afastando-nos do aconchego, do convívio com a família. E as pessoas foram se distanciando, os relacionamentos foram se banalizando e os namoros foram se transformando também. Hoje, nas festinhas, nas baladas, é normal um jovem “ficar” com meia dúzia de meninas e o inverso também acontece. Não há mais mistério nos beijos, em carícias. São torneios de quem “fica” mais. E os BV – boca virgem – são alvo de gozações. Ser virgem é passar atestado, é pagar vale, é mico e dos grandes. E a beleza da descoberta, do perder o sono, dos bilhetes, das mãos suadas, do coração disparado e o nó na garganta, o ser feliz desde o antes, e mais feliz no depois, tudo isso sumiu.
Felizmente ainda existem casais de namorados, de noivos, casados, para quem o 12 de junho se renova todo dia. Mas são raros. Em extinção.
Não é saudosismo. É um lamentar profundo acerca do que os jovens de hoje estão permitindo. As meninas passam da sandália infantil para o salto, para a plataforma que as lança, como foguetes, em espaços vazios. E um sonho comum: ser modelo. Passarelas bem longe, afastadas do olhar que as ama, em dietas constantes, inclusive de afeto. Os meninos, em aspiração maior, transformam-se em cadernetas de poupança, com rendimentos incertos nos campos de futebol. Cultura e educação são supérfluas. As pessoas da minha geração talvez concordem comigo, mas eles, adolescentes e jovens adultos, certamente, me julgarão ultrapassada, careta, como até esta expressão deve ser.
O queimar etapas deixa vazios que nada preenche depois.
Ficar a gente fica com dor de barriga, dor de cabeça, pobre, rico, triste, alegre, na janela, desempregado, à espera. Mas com o outro não é só o ficar. É o compartilhar, o sonhar juntos, planejar futuros e gentes. Não ficar por ficar. Há casos de adolescentes que ficam e sequer sabem o nome um do outro. Há, também, o de crianças que têm a mobília do quarto trocada todos os anos, o som, o televisor, o computador, que têm cartões de banco e de lojas, mas que, ao serem questionadas, confidenciam amarguradas: “Gostaria imensamente que os meus pais brigassem comigo!”.
Isso é triste, gente! Nossos filhos e netos estão perdidos, seus rompantes, desaforos, falta de respeito e de gratidão, nada mais são do que gritos de socorro.
Até quando vamos “ficar” inertes? Vamos nos aproximar de nossos filhos, trazê-los dos vãos escuros das escadas, dos esconderijos dos condomínios, das festinhas que fazemos questão de levar e de buscar, mas que não sabemos o que rola lá dentro. Basta de desvalia, de solidão mascarada. Conversar, ensinar passo a passo, o sabor de um beijo, o passear de mãos dadas, a preparação lenta e segura para relacionamentos mais sólidos, para entregas reais. Ensiná-los a namorar. Servindo de exemplo, inclusive.
*Escritora


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